Fico a imaginar… Assim como eu acho graça no modo de os
portugueses falarem e estranhar algumas palavras e expressões do dia a dia
deles, eles próprios devem achar a mesma graça ao me ouvirem falar e utilizar
expressões tipicamente da nossa língua – embora eu, estando cá em Portugal,
evite falar muito rápido e também carregar no meu sotaque, este que já é uma
mistura de paulistano com gaúcho. Pois este é mesmo o tema de hoje: expressões
e palavras portuguesas que me soam estranhas e/ou engraçadas.
Aliás, nunca ouvi tanto Pois em toda
a minha vida. Pode significar desde um simples “Sim”, um cumprimento (ex.: uma
pessoa diz: Bom dia! E a outra responde: Pois!)
ou mesmo o que ele se propõe a ser e é – uma conjunção – em ambas as línguas
portuguesas: 1. Por conseguinte, portanto, logo. 2. Então, nesse caso. 3. No
entanto, mas. 4. Visto que, porquanto, pois que, porque – ou como advérbio: 5.
Pois sim, pois claro, por certo, pois não (empregando-se também como partícula
expletiva: Pois hei de sair com este tempo).
Ah, pá acho engraçado demais; pode estar
no início ou no meio da frase, seria o “you know” que os norte-americanos falam
constantemente no dia a dia. Equivalente ao nosso “Então”, mas pode ser também
o nosso “Não é”, “Né”.
Não há hipótese: a nós parece ser tão formal
esta expressão, existente na nossa língua portuguesa brasileira, e quer dizer
mesmo que “não há a menor possibilidade” ou, no bom e velho coloquialismo, “não
dá para fazer” etc., mas em Portugal é uma expressão falada corriqueiramente,
bem como Não faz sentido, que quer dizer mesmo isso, que
“não faz sentido”.
Porreiro: diz-se quando algo agrada ou tem
qualidades positivas (ex.: tipos* porreiros; casa
porreira; ambiente porreiro). É o belo, bom,
curtido, excelente, ótimo. É ainda aquele que inspira simpatia (ex.: o
colega dela é um porreiro). Utilizado também como interjeição informal:
exclamação usada para indicar admiração, aprovação ou entusiasmo (ex.: porreiro,
pá!). Sempre que ouço, preciso me controlar para não rir
escancaradamente, pois é difícil não lembrar do nosso “Porra!”, que nada tem a
ver com o significado de Porreiro! Um sinônimo geral
de Porreiro! é Fixe! – o mesmo
que nosso “Legal!”. Tem também o Giro! ou Muito
giro!, que pode ser “bonito”, “lindo” (ex.: saia gira);
“elegante” (ex.: estás gira, hoje), “interessante”, “com
qualidade” (ex.: livro giro) ou “que tem qualidades
positivas” (ex.: ele teve uma atitude gira).
Ah, e para não deixar passar, o nosso “Porra!” (ou “Nossa!”
ou “Putz!”) é mesmo Fogo! para eles.
*Tipo = qualquer pessoa cujo nome se
desconhece ou se quer omitir; fulano, gajo**, indivíduo, sujeito. **Gajo =rapaz.
Caraças! como interjeição exprime espanto,
impaciência ou indignação. Posso afirmar que, se estivéssemos no Brasil, esta
interjeição seria o nosso “Caramba!” ou “Caralho!” ou mesmo “Porra!”.
Outros significados:
Como o caraças ou Para caraças:
com grande intensidade; em grande quantidade.
Do caraças: muito grande (ex.: és
um mentiroso do caraças) = do caneco, do
catano; admirável, espetacular ou sensacional (ex.: o filme
é do caraças) = do catano.
O caraças: exclamação que indica
desacordo relativo a afirmação anterior (ex.: figura incontornável,
o caraças).
Estou lendo o terceiro livro, chamado O Reino do
Meio, de uma trilogia (que inclusive indico!) escrita por um jornalista e
escritor português muito aclamado chamado José Rodrigues dos Santos, onde nos
diálogos aparece bastante a expressão …, pois não? no
fim das frases (ex.: ela não seria capaz de uma coisa dessas, pois
não?), o que seria equivalente ao nosso “…, não é?”, “né?” ou “…não é
mesmo?”.
Vive a lamber as botas! Está aí algo que
nunca consegui fazer: “Puxar o saco” de ninguém que seja, embora eu reconheça
que isso faça parte (essencial) do mundo (podre) corporativo.
Se você “vai lá, a qualquer lugar”, como bom aprendiz de
português de Portugal, diga sempre que vai lá ter, seja
para beber um copo (“tomar uma” – uma cerveja, um drink,
uma qualquer coisa alcoólica), seja para simplesmente “encontrar alguém”. E, se
for sexta-feira então, vem mesmo a calhar, ou seja,
“apresentar-se a ocasião”, “agradar”, “ficar bom”. Entretanto, se
calhar é melhor confirmar a previsão do tempo porque “talvez”, “é
possível que”, “provavelmente” chova.
“De cabo a rabo” é de fio a
pavio (ex.: ler tudo de fio a pavio). Folgo
em saber disso (“Bom saber disso”).
“Quer se livrar de alguém e colocar para correr”? Ponha-lhe uns
patins (ex.: a ele já lhe pus uns patins).
Convém dizer Olá (“Oi”) ao atender
o telemóvel (“celular”), embora a maioria diga Estou ou
simplesmente Tô (“Alô”) após tocar no ecrã (“tela”).
Ao se despedir, seja gentil e diga Com licença (equivalente
ao nosso “Tchau”).
Para limpar a casa de banho (“banheiro”)
bom mesmo é lixívia (“água sanitária”), a
deitar (“jogando/colocando”) na sanita (“vaso
sanitário”) sem puxar (“apertar”) o autoclismo (“descarga”).
No autocarro (“ônibus”), comboio (“trem”), eléctrico (“bonde”), a
conduzir umaviatura descapotável ou não
(“dirigindo um carro conversível ou não”, um camião (“caminhão”),
uma mota (“moto”) ou mesmo de boleia (“de
carona”), o alcatrão (“asfalto”) é, em geral, de
qualidade, com alguns trechos em exceção. É fácil se localizar, pois nas paragens (“pontos
de ônibus”) tem mapas, linhas/nomes dos ônibus, horários e o tempo restante de
cada um a passar. O importante é cuidar sempre com a passadeira (“faixa
de pedestres”), pois, ao menor movimento do pedestre, é obrigatório parar.
É comum aos homens vestirem fato (“terno”),
mas há os que prefiram as T-shirts(“camisetas”). E qual o
problema se já até vi mulheres de fato de banho (“maiô”)
caminhando pelas ruas do centro do Funchal em pleno verão?!
Assim como o brasileiro, o português adora uma tasca (“boteco”)
para tomar um imperial ou fino (“chope”),
mas são os talhos (“açougues”) que estão sempre a
faturar.
Nos supermercados, por um lado, tem vinhos
dos bons a 2€, por outro lado o bagaço (“cachaça”) é caro! No frigorífico (“geladeira”) de casa não pode faltar fiambre (“presunto”), papaia (“mamão”) e sumo (“suco”) de
laranja no pequeno-almoço (“café da manhã”), apesar de, na maioria dos dias da
semana, eu optar pela chinesa ou média de leite (“café com leite”) na chávena (“xícara”). Presunto(“bacon”)
mesmo só na sopa de caldo verde que o Renato faz. Claro que,
como boa paulistana, preferia (“preferiria”) tomar
o pequeno-almoço em uma pastelaria (“padaria/doceria”)
ou café (“lanchonete”), mas ficaria demasiado caro, no
fim das contas.
Rebuçado é aquilo “que não se mostra
totalmente”, “disfarçado”, “encoberto”, “oculto” em ambas as línguas
portuguesas, mas em Portugal pode significar também “bala” (a guloseima).
Falando nisso, “sorvete” é gelado – parece-me que por
influência do gelato italiano.
Para finalizar, um bocado mais de A a Z de palavras soltas:
Agrafador é “grampeador”; alforreca é
“água viva”; aceder é “acessar”.
Biberão é “mamadeira”; betão é
“concreto”; banda desenhada é “quadrinhos” (não me
pergunte por quê ou de onde vem); bairro de lata é
“favela” (que nem se compara às nossas favelas, diga-se de passagem!); bicha é
“fila” (toda a gente/todo mundo sabe disso, inclusive os
brasileiros, mas quem disse que me lembro de falar bicha em
vez de “fila”?!).
Castanho, existente na nossa língua, é também
o nosso “marrom” (se calhar os portugueses não entenderão se
você disser “marrom”). Constipação além de ser “prisão
de ventre”, como na nossa terra, é o nosso “resfriado”. Claque é
“torcida”.
Dobragem parece-me um erro de quem não
sabe falar “dublagem”. Dividir é “parcelar”.
Esquadra é “delegacia”; equipa é
“time/equipe”.
Miúdo é “moleque/criança”.
Tive uma certa dificuldade em encontrar “creme de leite” no
supermercado, porque aqui é nata.
Pontapé de canto é “escanteio” (faz
sentido, rs); paneleiro é “homossexual”; portagem é
“pedágio”.
Quinta é “fazenda”.
Relvado é “gramado”; rés-do-chão é
“térreo”.
Verniz é “esmalte”; vinil é
“adesivo”.
Não te rales (“não te preocupes”), a vida
é mesmo assim, a viver e a aprender, estás a perceber? (“entendeu?”).
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Fonte de pesquisa para algumas expressões citadas neste
texto: Dicionário Priberam da Língua Portuguesa (https://www.priberam.pt).
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